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  • Foto do escritorJudivan Gomes

Experiente jornalista revela momento tenso com Bolsonaro atrás das câmeras



Âncora comenta relação do presidente com a imprensa, ataques a Bonner, fama de ‘direitista’ e pressão do PT

Boris Casoy é sinônimo de jornalismo e coragem para opinar (e desagradar). Seu bordão "Isso é uma vergonha" - criado quando era âncora do 'TJ Brasil', no SBT, na década de 1980 - continua insuperável e mais oportuno do que nunca.

Isolado em sua casa desde o início da pandemia, o jornalista faz de seu escritório-biblioteca o estúdio onde grava o 'Jornal do Boris', transmitido no YouTube e na TV Gazeta de São Paulo, de segunda a sexta, às 8h45.


Com a experiência de quem dirigiu redações, comandou bancadas de telejornais e mediou debates, o veterano comenta a tumultuada relação de Jair Bolsonaro com a mídia e conta uma situação tensa com o então candidato à Presidência nos bastidores da RedeTV, em agosto de 2018.

Ao longo de sua carreira jornalística, o senhor viu outro presidente com relação tão complicada com a imprensa como Bolsonaro?


A relação tensa do presidente Bolsonaro com a imprensa tem sido mais visível do que em outros governos. O presidente tem mostrado gostar do confronto e ele o faz publicamente. Lembra repentes de Jânio Quadros. Na maioria dos governos, as pressões e tensões acontecem nos bastidores. Cito, como exemplo, o governo Lula, que agia por interpostas pessoas. Eu mesmo vivi um episódio desses com corte na publicidade da Rede Record. Esses momentos foram mais acentuados nos casos do assassinato do prefeito de Santo André, Celso Daniel, e do Banestado. O PT pressionava para que esses assuntos fossem encerrados. Não se pode esquecer dos governos militares, quando o Estado de Direito está suspenso. Destaco que, no meu caso, Sarney, Collor, Fernando Henrique e Temer sempre agiram de maneira republicana.

O âncora no cenário do 'Jornal do Boris': notícias do dia comentadas na internet e na TV Foto: Reprodução

Qual a sua opinião sobre os ataques, xingamentos e até palavras de baixo calão usadas pelo presidente contra jornalistas?

Reprovo com veemência. Cabe aos governantes conter seus impulsos. A chamada liturgia do cargo não admite esse tipo de comportamento. Sei que isso é difícil para uma pessoa impulsiva como Bolsonaro, mas ele precisa se esforçar para conter seus impulsos. O governante não pode agir com o fígado.

Os ataques frequentes de Bolsonaro, com ampla repercussão na imprensa e nas redes sociais, enfraquecem ou fortalecem o jornalismo profissional?

Nem enfraquecem, nem fortalecem. A maior parte da imprensa tem apenas relatado os fatos e investigado o que precisa ser investigado. Fazer oposição não é brigar com a notícia. Omitir os fatos é uma traição ao leitor, ouvinte, telespectador ou internauta. É preciso separar propaganda de notícia.


Bolsonaro se diz perseguido pelo Grupo Globo e, especialmente, pelo 'Jornal Nacional' e seu âncora e editor-chefe, William Bonner. O senhor enxerga veracidade nessa acusação?

Não me sinto no direito de julgar o Grupo Globo. O presidente insiste em colocar em xeque a sobrevivência da Globo. Não tenho condições de dizer o que se passa na cabeça do presidente, como ele encara o noticiário dos órgãos das Organizações Globo. Acredito que se sinta injustiçado, mas ele contribui decisivamente com a oposição ao governo. Acusar o Bonner de perseguição demonstra um desconhecimento de como funciona uma empresa de comunicação. Bonner é um excelente profissional, com uma história que mostra toda a sua correção e honestidade.

O senhor sofreu pressão ou intimidação direta de autoridades? Algum presidente chegou a reclamar de seus comentários críticos?

Tenho mais de 60 anos de carreira. Fui editor-chefe da 'Folha' em momentos difíceis do regime militar, perdi a conta das ameaças, mas me orgulho em dizer que em lugar de medo, me deram mais coragem.

Em evidência novamente, o ex-presidente Lula sempre defendeu a regulação dos meios de comunicação. O senhor enxerga esse projeto como positivo ou um risco à liberdade de imprensa com a possível interferência do Estado nas empresas do setor?

Ele chegou a elaborar um projeto sobre o assunto. Chamava essa 'merda' democratização da comunicação. Era uma velha ideia do stalinismo, cuja prática visava estabelecer a censura e intimidar a imprensa. Não se trata de maldade, o PT acredita que esse tipo de 'disciplina' faz bem ao Brasil.

Nos Estados Unidos, as principais redes de TV assumem posição ideológica e partidária, inclusive na campanha presidencial. O senhor acha isso positivo ou vai contra a imparcialidade e isenção imprescindíveis ao jornalismo?

É uma questão cultural. Acho legítimo que isso aconteça, sem amordaçar o adversário. Apenas, opinião não pode nem deve ser confundida com cobertura dos fatos.

No Brasil, a maior parte da imprensa é identificada como defensora da esquerda. O senhor já disse que 'ser liberal ou de direita é quase um crime' no País. A imprensa está contaminada pela militância política?

Já esteve mais. O socialismo era uma promessa que entusiasmou grande parte da intelectualidade, especialmente a juventude. A queda do Muro de Berlim, o fim da União Soviética e todas as suas consequências mostraram a verdade a muita gente, especialmente aos mais jovens. Acho que o debate deve ser estimulado. Mas há uma esquerda saudosista no País que, por exemplo, continua repetindo que a guerrilha no Brasil lutou pela democracia. Lutava sim, por um regime comunista e começou ainda no governo Jango. Isso não justifica a tortura. Aliás, acho que se a anistia fosse revogada, os dois lados precisariam ser julgados.

Nos Estados Unidos, há várias emissoras declaradamente de direita, como a Fox News. O senhor vê Record, RedeTV e SBT, onde trabalhou, como canais direitistas?

Trabalhei com absoluta liberdade em todos os canais. Procurei dar voz e dei a todas as tendências ideológicas, nunca houve restrição. Quando ameaçou haver, estrilei. As redações que dirigi nunca sofreram filtros ideológicos. Mesmo assim, sou visto como um direitista empedernido, caluniado, como se a esquerda tivesse a patente da bondade e democracia.

O senhor foi mediador de vários debates importantes em eleições à Presidência. Cite um momento especial desse tipo de evento na TV.

Dois momentos: quando Lula recusou cumprimentar Collor, ao contrário do que tinha sido combinado, e a ameaça em cima da hora de Bolsonaro de não participar do debate na RedeTV. Ele já estava no camarim e queria impor sua vontade na questão da cadeira vazia para Lula.

O que acha da relutância de Bolsonaro em liderar a campanha de imunização no País?

Ele tem sujas posições. Aparentemente, está caminhando em direção às recomendações da maioria absoluta dos cientistas. Espero que ele seja iluminado e torço para que Bolsonaro faça um bom governo. Sou contra o 'quanto pior melhor'. Se ele afundar, afundamos junto.

O senhor completou 80 anos em fevereiro. Há algo que ainda pretenda fazer no jornalismo?

Atravesso um período de pleno vigor físico e, ao que parece, mental. Estou vivendo uma experiência na internet com o ‘Jornal do Boris’, também transmitido pela TV Gazeta. Assim completo um ciclo do qual me orgulho: fiz rádio, TV, imprensa escrita e agora internet. E estou pronto para novas viagens.


Com Sala de TV

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